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Meu pé de goiaba lima



Um pé de goiaba nasceu, intruso, entre dois arbustos de flores na cores carmim e lilás. Quis arrancá-lo de lá, mas foi ficando e crescendo, esquecido. Até que desabrochou em goiabas, várias, num verde-amarelo bonito e perfumado. As goiabas levaram-me à infância. Nunca gostei da fruta, preferia as mexericas, as laranjas, as mangas, as amoras, os jamelões que chamava de pitangas. Era o pomar das férias, mas goiaba tinha bicho... 

As goiabas do meu jardim levaram-me à minha mãe, ainda moça, esticada no sofá, pés descalços balançando. Ela adorava ler e lia Meu Pé de Laranja Lima. Eu não havia desvendado ainda o segredo das letras unidas, mas ouvia dela o conselho para ler aquele livro. Aos poucos, ela foi me ensinando a importância da literatura, das palavras, dos adjetivos. Ela adorava os adjetivos e estimulava que os usasse nas primeiras redações: flores multicoloridas, pétalas aveludadas, melodia encantadora dos pássaros.

Anos mais tarde, tive que engavetar os adjetivos. São completamente dispensáveis em textos jornalísticos. Mas com as crianças admirando as goiabas do meu jardim, não poderia deixá-las cair no chão e apodrecer. Peguei uma escada para alcançar as frutas. Clara, voltava do balé, subiu em outra árvore para acompanhar a novidade. A manhã estava linda e ela balançava tão graciosamente os pezinhos...  Bruna ficou em casa bagunçando a sua pilha de livros para achar o Meu Pé de Laranja Lima.

 As goiabas foram para a panela. Achei que poderia inventar um doce. Meu marido, que adora goiaba, deu uma mordidona. "Não tem bicho", sentenciou. "O que você vai inventar? Não vá colocar fogo na casa..." Engraçadinho ele, não? 
Demorou pouco para a casa toda ficar cheirando goiabada. Bruna lia o livro, não gosta de doce. Clara e eu raspamos a panela com colher de pau. Ficou tão bom com queijo-minas! Meu primeiro Romeu e Julieta, graças ao meu pé de goiaba lima.

5 comentários:

  1. Na casa de minha mãe, Rua do limoeiro havia um pé de goiaba e um roseira e uma pimenteira e um pé de louro.
    Hoje há tralhas, mato eum pé de figo. Adoro!

    Na minha época e da goiabeira, subi muito, peguei com vara, comia do pé, sem nem lavar, comia de achar só a metade do bicho da goiaba e nada de me importar...rsrs

    Muito doce minha mãe fazia, as de lá eram brancas, muitos sacos distribuíamos aos amigos e vizinhos.

    Cheirinho bom, saudade senti.

    Obrigada pela doce lembrança :)

    Bom dia por ai, com beleza de flor de pequi, gostinho de goiaba no pé, alegria de ouvir e falar cranberry, saúde por comê-las e curiosidade em vê-las

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  2. Oi Rovênia
    ... goiaba 'lima' é ótimo ! rsrs
    e um texto que foge as regras jornalísticas e carrega na nostalgia da casa da mamãe e das delícias e encantamentos da meninice ,
    amo esse milagre que transporta o tempo através das lembranças muitas vezes tão nítidas que queremos repetir e sentir de novo aquela presença e aquele cheirinho de antes,
    voce conseguiu!
    Adorei sua passadinha 'lá em casa' rs
    e este post está lindão.
    beijinhos beijinhos

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  3. cara, você é muito ruim com suas leitoras. QUE VONTADEEEEEE :( preciso comre esse doce, agora, praticamente. não posso esperar.
    com queijo deve ter ficado mto bom *-*
    postei a continuação da historia :)

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  4. Hummmm, adoro goiaba.

    Há uma cena no filme 'Cidade dos Anjos' em que o anjo apaixonado ao ver a mulher fonte de sua paixão provar uma pera lhe pergunta: "que gosto tem essa fruta?". Ela descreve: "é suculenta, doce e se desfaz na boca como grãos de areia...". Ele esclarece: "Não! Eu gostaria de sabe que gosto ela tem em você". Depois, ele parte solitário para a biblioteca e vai ler Hemingway descrever o sabor das ostras misturadas com vinho branco. Acho de um lirismo descomunal a cena. Viajei, né, Rovênia. Desculpe.

    Quanto às goiabas, delícia, tanto quanto teu texto.

    Ótima terça para você!

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  5. Que lindo!!!
    Um pé de "goiaba lima" rsss
    amei toda a aventura do começo ao fim, só faltou sentir o gostinho também rssss
    Existem coisas na nossa vida que não tem preço e essa aventura toda é algo valioso que será lembrado futuramente como tesouros do passado.
    Beijos
    Joelma

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