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Chama de futuro

Imagem: Google

Às vezes, fico assim,  em desânimo,
porque essa vida parece castigo.
Como posso ser feliz, se há
tanto sofrimento ao meu redor?


Mas quando vejo nos olhos da criança
o quanto de sonhos ela guarda
Deixo escorrer as lágrimas,
e recobro as esperanças: 

a vida tem chama de futuro 
e pode, sim, ser bela e sem dor!





"Sou o que sou em virtude do que todos somos." 
Desmond Tutu


Ideia no rascunho


Arquivo pessoal
A vergonha rendeu-me oito quilômetros e seiscentas calorias a menos. Mas serviu para perceber que apertar a tecla errada pode revelar o esboço de uma ideia que talvez nunca seja escrita. 

Pior que passar a noite em meio ao pesadelo da certitude do erro da véspera, de ter reescrito a biografia de Edith Piaf no passé composé e não no passé simple , é ter ido conferir os e-mails na manhã clara de domingo. 

Estavam lá os nomes de Manoel, Lis, Chica, Ana Paula e Beatriz, simpáticos leitores que não criticavam os erros , como se fosse um texto na sua plena perfeição. A vocês, pela simpatia, meu respeito. Se bem me conheço, não teria ficado quieta. O que me faz concluir que vocês estão certos. Mais uma que aprendo nessa minha inquietude. 

Enquanto corria, consegui pensar um pouco sobre esse ambiente de academia. O político que todos conhecem traz a Veja, que vai lendo, nos intervalos dos aparelhos. Concluo que não faz direito nem a leitura nem a série de exercícios. Está ali para se fazer presente, cumprimentar, daqui a pouco aparece de fato. 

Há mulheres de 50 e 60 anos de pele tão lisa e mais músculos que as meninas de 20. Desfilam orgulhosas com os corpos sem celulite. Será o que andam lendo? Lembro de uma amiga de 50 anos, com os riscos da idade lindamente esculpidos no rosto:

- Quero ficar cada vez mais linda, mas por dentro! 

Disse-me essa frase um dia desses, olhando-me com seus olhos verdes, à espera de resposta. Não respondi nada e só agora começo a pensar ... 

A beleza não está no corpo, nunca esteve. Por que as pessoas se importam tanto com o corpo e esquecem a essência, o amor? A imperfeição é tão humana, tão bela... E o amor não considera as imperfeições porque nasce do toque, do olhar, do coração que não se vê, do qual só se sente o ritmo da vida.

A pessoa que corre ao meu lado, um moço fora de forma, começou a olhar-me de soslaio. Não me iludo porque não se trata de paquera. Deve ser mais um daqueles que não querem perder nunca para uma mulher em hipótese alguma. 

Ele, mesmo arfando como cavalo suado puxando carroça na subida de um morro sem fim, não vai desistir tão fácil. E as olhadelas que ele acha disfarçar são para checar o quanto você já correu. Finja que não o viu te vendo. E continue a correr. Deixe-o ainda mais desesperado e sem fôlego.

Então me dou conta de que posso dar um conselho às mulheres que querem aproveitar esta segunda-feira para começar a entrar em forma:

-  Procure uma esteira que não esteja ao lado de um homem, esteja ele em forma ou não. Homens assim, atléticos ou gordinhos, costumam suar demais, e ninguém vai querer receber os seus  respingos. 

Pronto, meu treino chegou ao fim. Tenho agora de pensar em como salvar aquela ideia do rascunho...


Bom início de semana e com as teclas certas!





Um lugar à mesa

Rose, dos Jetsons -  imagem/ Google
Ai, ai... esta semana andei irritada com o mundo. É difícil não se inquietar com absurdos. Como vocês já sabem, estou na fase de não polemizar. Mas os debates teimam em cair no meu colo. 

As empregadas domésticas, por exemplo. Adoro a Maria. Ela está lá em casa há uns dois anos. Começou como diarista e foi contratada agora, quando todos os patrões pensam em fazer justamente o contrário. 

Ela me acalma, me conta histórias da netinha Mariana. Sei tanto dessa pequena que ainda não conheço e ela já ficou feliz, que eu sei, com os presentinhos que mandei pela avó. 

Mas vamos à polêmica. O fato é que a Maria come quando tem fome. Como lá em casa é impossível durante a semana almoçar em família - cada um chega num horário e sempre correndo -, a Maria fica à vontade.

Quantas vezes, ela não almoçou primeiro ou sentou-se ao nosso lado para comermos todos juntos? E tudo bem. Não mastiga com a boca aberta, sabe servir-se educadamente, conversa tão pouquinho, fala baixo. Não nos incomodou. 

Somos amigas. Ela faz umas tranças lindas nas meninas, talento que não tenho. Ela ri quando elogio. 

- É fácil, Rovênia! Vou te ensinar... 

Como as novas regras trabalhistas das domésticas eram recheio de todas os noticiários e aqui é Globo News o dia todo, fartei-me com os detalhes e os comentários adjacentes, até que falei sobre a Maria. A moça, vestidinha de grife ao meu lado, exaltou-se:

- Mas como? Que absurdo isso. Lá em casa, elas não têm essa mordomia e nos tratam por "senhor" e "senhora". Precisam saber muito bem o seu lugar!

Calei-me e desde então tenho me mantido mais assim!

Mas, na verdade, nem sei por que contei isso. Queria falar da lua cheia que vi hoje ao acordar sobre o telhado da minha casa. E antes de sair de casa, li na agenda de escola das meninas esse pensamento:


"A vida começa todos os dias!"
(Érico Veríssimo)


Feliz fim de semana!





Perdidos no saber

Talvez seja melhor modernizar o nome desse blog para polegrafe. É um nome mais contemporâneo, mais de acordo com a era que vivemos. A ideia não veio do nada. É plagiada do livro A Polegarzinha, escrito pelo filósofo francês Michel Serres. 

Sugestão de leitura da amiga Ana Paula (que publicou seu primeiro livro) fez-me pensar e discordar, em parte, desse pensador. Polegarzinha é como ele batizou o internauta, essa multidão anônima que inaugura a nova era do saber sobre as elites. 

Com a agilidade dos dois polegares, a geração digital mergulha na rede de informações e se iguala ou ultrapassa a velha guarda que utiliza os dez dedos para digitar num teclado real ou virtual. Serres defende essa nova era de saber que substitui o saber magistral, antes acessado apenas por aqueles que estavam nos anfiteatros universitários e no meio dos livros. 



A era da Polegarzinha traz uma nova realidade em que o saber está acessível a todos. Todos agora dividem o poder de produzir conhecimento. Passam a ser agentes e não passíveis consumidores do conhecimento. É uma verdade, mas é preciso fazer ponderações. O saber não vem de graça. É preciso esforço, querer triturá-lo para que seja absorvido. 


Quem já aventurou-se pelas redes sociais, como o Facebook, e infindáveis blogs sabe bem como faz sucesso o trivial, o engraçado, o que não custa tempo de leitura. Não é por menos o sucesso dos 140 caracteres do Twitter. Como a massa anônima vai superar uma elite do saber se a preguiça impera? De que adianta ter diante de si todo o conhecimento da humanidade, se é preciso debulhá-lo e nem todos estão dispostos a esse trabalho? 


A Polegarzinha pode ser tanto a revolução quanto a continuidade da mediocridade do saber. Se ela não for capaz de emergir no meio desse saber farto e facilitado será uma Polegarzinha iludida. 


Uma massa que tem o privilégio do acesso ao saber virtual será derrotada pelo próprio alienismo se não se der conta de que é preciso ler de verdade. Ao se desconectar do fato de que não existe saber de graça, se a Polegarzinha não vier com a fome de pensar e de inventar o saber, estraremos na era do retrocesso massivo. 


Uma era em que muitos se deixarão iludir com o acesso ao conhecimento, mas  que muito poucos - uma elite apenas - continuarão capazes  de dominá-lo.  

Pensando...



 "Nossa sociedade trabalha com empatia. Temos necessidade de nos reconhecer, de encontrar pontos de referência na vida das pessoas públicas para que a adesão emocional opere."
 (Jean-Claude Kaufmann)


Ilustração Google


Que bom seria se fosse invisível, fosse somente pensamento. É o que no fim vale, fica a ideia. Nesse nosso mundo tão virtual, tão midiático, em que cada um tem voz, tem vez, tem palavras, há ilusões demais. 

Nesse mundo que Andy Warhol previu em 1968 - que no futuro, cada um de nós teríamos 15 minutos de fama - , queria estar bem distante. A fama não seria um elogio desnecessário, um estrago à produtividade? Não é melhor que venha depois que já tenhamos ido? Assim, ela não nos envaidece, não nos atrapalha. 

É tão bom ser ninguém, passar por todos e ninguém te ver! Assim você repara em todos, a insignificância de todos diante do universo. E reflete sobre a significância de todos dentro dos seus próprios íntimos. O tudo e o nada tão próximos, mas tão imperceptíveis!

Já saltei a fase de falar, de escrever. Não tenho mais nada a declarar e nem ponto final para concluir. Ando mais calada, mais pensamento. Deixo que outros falem, que escrevam. Só observo. Estou no menos eu, mais todo mundo. 

Tudo se resume agora ao pensamento. E o pensar real é maior que qualquer lógica escrita. O pensar e o escrever são dimensões impossíveis de juntar. 

Se você leu tudo que parece um pensamento, então não entendeu nada. Meu pensar é maior do que as palavras que estão aqui, nem sequer foi ainda escrito. Então, respiro fundo esse ar que é a minha própria vida. 



Choro mais feliz!


"Meu coração foi de bar em bar, 
Se perdeu nunca mais se achou 
Foi vivendo assim 
Sem ter ninguém para dizer um boa noite ..."




Arquivo pessoal:  pintura mural na Rua do Ouvidor, RJ,
local frequentado por Pixinguinha e os boêmios da MPB

Por que não andar pelo centro histórico do Rio de Janeiro, tomar café da manhã na Confeitaria Colombo, visitar a Praça Tiradentes,o Museu do Ipiranga, descobrir pequenas livrarias e monumentos esquecidos e ir parar na Rua do Ouvidor? 

Onde é a Rua do Ouvidor? Perguntei a um carioca de terno e gravata que andava apressado e me olhou com cara de espanto: 

- O que você quer fazer lá? Não tem nada mais lá. 

E foi embora levando o mau humor. Pergunta aqui, pergunta ali e cheguei à Rua do Ouvidor. Embora precise ainda de restauração, a travessa é uma graça. Tem uma pintura com as figuras da nossa música que costumavam frequentar o boteco com Pixinguinha. Na ruazinha, ainda há uma estátua em bronze do músico. 

Hoje é dia de Pixinguinha, do nosso chorinho mais gostoso de ouvir.  E aqui em Brasília tem um cantinho, o Clube do Choro, referência nacional em ensino da música popular brasileira. Uma amiga frequenta lá, leva seu cavaquinho com paixão. Quem sabe hoje ela não vá tocar e cantar ...

"Meu coração não sei por que 
Bate feliz quando te vê...
E os meus olhos ficam sorrindo
E pelas ruas vão te seguindo...
Mas mesmo assim, foges de mim..."






Vamos desenhar?

Para quem tem talento não importa o meio de expressão. Eu, como o pequeno aí ao lado, gostava de desenhar bichos da caverna na parede verde da frente da minha casa. Mas esse meu talento ficou bem lá no passado... 



Este fim de semana, encantei-me com a arte de Juan Francisco Casas, artista espanhol que utiliza a caneta Bic, essa a qual não damos muita bola, para seus retratos realistas.

Quer saber mais sobre ele? Clique aqui

Já o lápis é o instrumento que revela outros tantos talentos. Um deles é o designer gráfico Paul Lung, de Hong Kong, que utiliza uma lapiseira com grafite 0,5mm sobre uma simples folha de papel sulfite. 


Clique aqui para conhecer mais trabalhos desse artista genial. 


Outro é o jovem italiano Diego Fazio. De tatuador virou expert em técnicas de fotorrealismo. Também utiliza apenas lápis e papel. Clique aqui para ver mais desenhos feitos por ele. 

Enfim, fica a pergunta... Será que eles começaram com desenhos nas paredes de casa?

Meu nome é Mayôi



Meu canto de morte
Guerreiros, ouvi:
Sou filho das selvas,

Nas selvas cresci;

Guerreiros, descendo

Da tribo tupi


Da tribo pujante,
Que agora anda errante

Por fado inconstante,

Guerreiros, nasci:

Sou bravo, sou forte,

Sou filho do Norte;

Meu canto de morte,

Guerreiros, ouvi.




Quando eu era menina, decorei essas duas estrofes do meu livro da escola. Repetia porque achava sonoro, bonito. Naquela época, só se lembrava dos índios no dia 19 de abril. Faltava informação e sobrava preconceito. Hoje a abordagem indígena nos livros didáticos é muito mais ampla. São conteúdos inseridos em várias páginas. 

Infelizmente, há muita atualidade e esquecimento de clássicos. Os versos acima, por exemplo, são do nosso poeta indigenista Gonçalves Dias. Ele tentava elaborar uma epopeia intitulada Os Timbiras, "um projeto ambicioso em que os índios substituiriam os heróis gregos numa Ilíada brasileira, tropical, com abundantes e coloridas descrições da flora e da fauna." A narrativa teria como eixo a formação e dispersão do povo timbira. A obra, contudo, não ficou pronta.

Quanto aos versos finais que não decorei ...


E à noite, nas tabas, se alguém duvidava
do que ele contava,
Dizia prudente: 

- Meninos, eu vi!

... fazem referência à sabedoria dos mais velhos, dos pajés. Visitei uma vez a tribo indígena dos Khraò, em Tocantins. Passei lá dois dias, dormi em rede amarrada na oca feita de folhas de palmeiras. Eles dançaram a noite toda, assisti a uma corrida de tora, nadei no rio com as crianças indígenas e fui batizada com o nome de Mayôi, ratinha do cerrado. Leiam aqui.

O que mais me impressionou não foi o acesso deles à internet, mas a comunidade socialista. A divisão da carne da vaca em porções iguais, o arroz cozido com grãos de feijão para o almoço era colhido com a palma das mãos. Ninguém recebia porção a mais ou tentava dar uma de esperto. 

As crianças sentavam-se no chão para ouvir os ensinamentos do velho pajé, que era respeitado por sua sabedoria. O socialismo existe ali e, nós pobres civilizados, lendo nos livros a teoria de Marx.  



Esse vídeo foi indicado pela amiga Margoh.


Boneca de verdade


Emília deveria ser a primeira boneca de todas as meninas brasileiras. Ela é de pano, dona de toda a curiosidade , tem senso crítico e um mundo de fantasias naquela cabecinha sem miolo. É a mais pura tradução de um Brasil de antigamente, quando a indústria de brinquedos não injetava novidades nas prateleiras das lojas e a criatividade caipira reinava entre as famílias.

Ao dar vida à Emília, Monteiro Lobato imortalizou a época em que avós e mães criavam as bonecas de pano das filhas, das netas. Hoje esse fazer artesanal é cada vez mais raro.  Guardar retalhinhos, botões coloridos para criar bonecas e oferecê-las à uma criança é dar início a uma nova história, como as tantas que Monteiro Lobato escreveu. 

Basta dar um tempinho à pressa e observar. A criança presenteada , com olhos brilhando, um sorriso maior que o universo, vai sentar-se no chão e conversar com a boneca como se ela fosse gente. São as novas Emílias que ganham vida.  Genialidade percebida por um escritor sensível ao nosso Brasil rural do século XX. 

Que tal sentar-se hoje no chão, Dia Nacional da Literatura Infantil, e contar a história da boneca falante?  Que não virou menina de verdade, como o boneco de madeira chamado Pinóquio, mas ganhou vida para ser a única boneca gente! Uma boneca muito, muito inteligente.  Tanto que ela sabia bem matemática e a gramática do nosso português (Emília no País da Gramática e Aritmética da Emília), um desafio para as nossas crianças de hoje. Muitas ainda não conseguem se alfabetizar até os 8 anos. 

Flores da infância


Elas eram tão comuns que Dona Mariazinha as ignorava. Das flores que adorava plantar em latas de alumínio e bules furados pela ferrugem, elas não tinham nenhuma vez.

- Que florzinhas mais sem graça! 

A menina Ana Maria nunca tinha ouvido Dona Mariazinha falar isso. Também pudera... Dona Mariazinha nunca havia mesmo falado nenhuma palavra dessa frase. Só pensava. Ah, isso ela devia lá pensar! 

Aquelas florzinhas eram muito sem graça para enfeitar a varanda do quintal de Dona Mariazinha. Nas latas e nos bules, só copos de leite, damas da noite, cravos e rosas de todas as cores. 

A menina Ana Maria gostava daquelas florzinhas. Achava-as tão cheias de graça! De tanto cheirá-las e passar os dedinhos sobre as pétalas encantou a amiga Maria Ana. As duas, após a escola, já tinham tarefa certa. Davam as mãos e saíam pelos matos do bairro a catar as florzinhas que ninguém achava graça. 

Descobriram que eram florzinhas irmãs, mas que nasciam em três cores: rosas, brancas e laranjas. Colheram e encheram as mãos. Decidiram, então, que uma cor seria presente para Dona Mariazinha. Bateram à porta e entregaram todo aquele perfume. 

Dona Mariazinha sorriu. Achou graça das duas Marias. Mas qual a cor que ela teria escolhido? As meninas cresceram e esqueceram-se das florzinhas da infância. 




Não perca o humor

Quem tem filhos e dias corridos pela semana não vai rir. Vai entender perfeitamente e  não me achar uma louca. 

Mas é fato que, num ano sim, cheguei à escola com as gêmeas devidamente uniformizadas. Todas as demais crianças estavam fantasiadas. Princesas de todos os reinos, meninas-joaninhas e abelhinhas, bailarinas... 

Todas encantadas e sorrindo para mim.As mães delas com seus olhares dilatados do tamanho de uma lua cheia... 

Deviam estar pensando: "Nossa que mãe é essa? Como pode? Etc e tal..." 

Ufa...Não ia deixar as pequenas tristinhas. Dou um beijo em cada uma e lá me vou atrás da mais próxima loja de fantasias. Cartão de crédito serve para essas horas em que o momento não tem preço. Sei lá o preço das fantasias. Quero duas! 

Vocês acham que foi só? No ano não, um dia para comemorar o carnaval na escola. Chego na hora certa, todas as outras crianças uniformizadas e as gêmeas fantasiadas de espanhola. As únicas! 

A comemoração seria na próxima semana, na outra sexta-feira. De novo, os olhares dilatados das mães: 

"Nossa que mãe é essa? Como pode? Etc e tal...

Bom, vamos rir um pouco com essa comediante francesa, Florence Foresti? 


Palavras com alma

Escrever é como um desabafo. As palavras não precisam estar vestidas a rigor. Aliás, as melhores são aquelas que surgem naturalmente. 


Imagem do Google
A beleza de um texto não está nas palavras isoladas,escolhidas demais, aquelas que nem todos sabem o significado. A soma de todas deve resultar em alma. 

Ponha em prática a humildade e deixe que a beleza do seu texto se forme na mente de quem o lê. 

Se ao terminá-lo, o leitor trocar o ponto final pela exclamação, você terá conseguido ser simplesmente isso: um escritor. 

(Rovênia Amorim)

Fim que alegra

Ilustração de Scott Campbell


O cansaço está estampado no rosto e é preciso o esforço de um sorriso para abrandá-lo. E então a gente se dá conta de como é valioso o fim. O fim de todos os dias da semana, com todos os deveres cumpridos. 

O fim do trabalho, quando se chega em casa e se atira os sapatos de salto num canto para pisar no chão macio. O fim do livro e da história lida. O suor escorrendo, o controle da respiração e da mente e o fim daquela corrida em que a chegada parecia tão longe... 

Como não ficar tão feliz?   

E, enfim, o fim de semana ao nosso alcance. Poder dormir um pouco mais abraçada ao travesseiro. A chuva lá fora... O sol lá fora...  Poder sorrir sem esforço algum. 





Um bom fim de semana!

Sonhos, meus e teus


Tumblr
Três pessoas vieram me avisar recentemente que sonharam comigo. Uma contou que eu distribuía ovos de chocolate a crianças carentes. A outra que eu pedia conselhos sobre aceitar ou não um novo emprego. E a última que estava grávida de gêmeos, de novo! 

Bem acordada, comecei a ler ontem um novo livro, contos de Jorge Luis Borges. O primeiro deles é O outro, que conta um sonho do escritor, onde encontra ele mesmo. No fim descobre que o outro o sonhou, mas não "rigorosamente". 

Por que conto isso, não sei. Talvez porque um dia sonhei que encontraria um grande amor. Acordei assustada, admirada com o absurdo. Não é que vivo esse sonho na mais pura verdade?



"O poema ganha se imaginarmos 
que é a manifestação de um anseio, 
não a história de um fato."

(Jorge Luis Borges, em O Outro)

Rendição

Arquivo pessoal

Conte-me uma coisa que não saibas fazer e
direi que não sei juntar os ingredientes de um bolo. 


Bem que poderias me confessar que não sabes trocar a lâmpada,
envergonharia-me menos dos dedos que sangram para bordar a flor.

Se me mostrasses que fechas os olhos para sentir a música, 
eu dançaria sem tocar os pés no chão. 

E se mentisses uma vez sequer que me ama, 
meu coração acreditaria por uma vida inteira. 




(*) Já recebeu um presente e sentiu o carinho? A amiga Solange, de Santa Catarina, não espeta os dedos na agulha e inventa coisas lindas. Olha só o que ela faz, o talento e o amor em cada detalhe! Um "canteiro de ideias" para a gente desvendar. Obrigada, amiga!

A fraqueza no poder

 
Google Images

Quando ela era criança gostava de ficar olhando os bichos no chiqueiro, na fazenda do avô. Eles gostavam de abóboras que eram jogadas inteiras. E tudo que ela queria era pegar um bicho de pé. Todos os primos já tinham tido e ela não achava justo. 

Diziam que dava uma coceira boa no pé. Espiou para os lados, a mãe e a avó nem prestavam atenção nela. Então tirou as botas e subiu no muro do chiqueiro. Ficou andando pra lá e pra cá até as duas notarem. Deu certo. Teve o seu bicho de pé e nunca mais quis levar espetada de agulha no dedão. 

Mas essa história toda aí acima é para dizer que anos mais tarde ela descobriu que no horóscopo chinês ser porco é ter humildade e sabedoria. É um animal inteligente, sabiam?

Talvez se Stálin e Trotski compartilhassem dessa mesma admiração, os comunistas não teriam se assustado tanto com o clássico A Revolução dos Bichos, de George Orwell. Quem leu precisa reler, pelo menos uma vez, essa sátira atemporal. E quem não leu, pode até morrer sem pegar bicho de pé, mas deixar a obra-prima mofar na estante é um crime!  

O final do livro é uma filosofia atualíssima para repensarmos nossa sociedade, entender a utopia que dividia o mundo na Segunda Guerra Mundial e que uniu Inglaterra e União Soviética contra o nazismo. Em troca do apoio, a sociedade britânica elitizada, que viu nascer o capitalismo nas suas fábricas, não enxergava a ditadura stalinista. 


Em 1945, escreveu o jornalista no prefácio para a primeira edição inglesa do livro: "A lealdade acrítica à URSS transformou-se na ortodoxia do momento, e sempre que os supostos interesses da URSS estão envolvidos, nossos intelectuais se dispõem a tolerar não só a censura como a falsificação deliberada da história."  



Os muros desabaram sobre as utopias capitalistas e socialistas, mas vivemos cercados por outras cegueiras sociais e políticas nesta primeira década do século XXI.  Precisamos de novos modelos, porque até agora os pensadores clássicos parecem resumir nossas ignorâncias recicladas. No poder, todos se encantam demais, se corrompem e se esquecem dos ideais igualitários. Nunca houve revolução de fato, de alma. 

Na visão de Orwell ser porco é como ser homem. Sem diferença. São as fraquezas humanas tão bem representadas pelos porcos intelectuais que tomaram a liderança (o poder) na Granja do Solar:


"Doze vozes gritavam, cheias de ódio, e eram todas iguais. Não havia dúvida, agora, quanto ao que sucedera à fisionomia dos porcos. As criaturas de fora (os bichos da Granja do Solar) olhavam de um porco para um homem, de um homem para um porco e de um porco para um homem outra vez; mas já era impossível distinguir quem era homem, quem era porco." 
 









Doce beija-flor




Eles são admiráveis. Beijam as mais lindas flores, exibem-se parados no ar e são capazes de voar para trás. Ver um beija-flor é ter instantes de alegria, sentir o coração bater mais rapidamente feliz. 

Uma vez ganhei uma contracapa do jornal de domingo para falar desses pássaros. A página ficaria linda com as imagens. Fui atrás de especialistas, tal e qual manda o figurino. Fiz tudo certinho, com capricho. Estava empolgadíssima com o texto leve que poderia escrever. Era mais que uma pauta, era um presente!


Missão cumprida, texto na página, imagens coloridas de beija-flores. No dia seguinte, fui recebida com admiração:

- Nossa, não sabia que você gostava de compota de beija-flor?

Como assim? Não estava entendendo nada... Foi então que o meu editor mostrou-me a contracapa: havia escrito "calda" de beija-flor e não "cauda" de beija-flor. Os revisores falharam também e o erro foi publicado e multiplicado em legendas.


Imagens do Google
Enfim, conto essa historinha porque um dia desses comentei sobre essa nossa língua portuguesa. É fácil errar, não? 

Moral da história: o encantamento quando é tanto nos cega facilmente!


Brasileiros coloridos

Esta semana conheci uma pessoa linda, branca (se é que isso existe!) e de pura alma negra. Ela me disse que adora os negros, suas cores, sua alegria, seus adornos. 

Aproveito para confessar que nunca, de verdade, dei importância também a cor da pele das pessoas. O meu primeiro namorado era negro e o engraçado é que meu pai, mineiro conservador, não fez qualquer ressalva quanto a isso. Eu enxergava a alma desse namoradinho, não a cor que tinha. Poderia ser até verde, como o Incrível Hulk.

Mas essa encantadora mulher, que mora em São Luís, me trouxe essa lembrança e a história do grandioso Nelson Mandela:

"Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar."

Há tantos negros maravilhosos, como há tantos outros brancos. Mas o mais maravilhoso é quando eles, brancos e negros, se mostram humanizados. 

Enfim, um ótimo fim de semana com presentinhos:

1º) Uma brincadeirinha para distrair:  onde está Wally? Um pedacinho da nossa redação e de como arrumamos um tempinho para brincar. 





2º) Para o Will, seguidor fiel, que faz aniversário hoje, meus parabéns!(E não me pergunte como descobri. Sou jornalista, lembra?)


3º)E para minha querida amiga Tina, um presente para ouvir: o talento dessa mineira mais baiana e mais Brasil que a MPB já nos apresentou. 






Liberdade conquistada




Como esquecer o dia em que você se equilibrou sobre a bicicletinha e sentiu o vento no rosto e os cabelos jogados lá para trás? Uma emoção dos tempos de criança que a gente carrega como liberdade conquistada pela vida afora. 

Pois não é que a capital de pistas planas e largas, dominada pelos carros, vai ganhar ciclovias? Que delícia ver turistas tirando os braços do guidão diante das belezas da Esplanada dos Ministérios, sob esse céu encantador, amplo de horizontes nos quatro cantos cardeais. 


Fotos: Rovênia Amorim
Sonho com minha  bicicleta retrô, de cestinha cheia de flores perfumadas, a  percorrer uma Brasília menos poluída, cercada por um lago da cor do mar. 

Acredito no brasiliense que deu exemplos de civilidade ao frear seus carros para dar vez aos pedestres nas faixas. Ele vai, sim, respeitar os ciclistas. Campanhas educativas serão necessárias.

As pistas já estão em construção pelos gramados verdes.  Daqui a pouco você pode pedalar comigo. 

Educação sem flor

Imagens do Google
Depois que acontece, é preciso um tempinho para acreditar que tudo ocorreu de verdade. Vamos aos antecedentes porque toda tragédia parece ser anunciada. Um dia desses cheguei para buscar as meninas na escola. Por serem gêmeas, estudam em salas diferentes. Portanto, cada uma tem a sua própria professora. O caso envolve a professora da Bruna. Pois então, ela me perguntou:

- Nossa, a Bruna escreve ainda tão errado, né? É engraçado porque ela lê tanto...

Dei um sorriso desse tamanho de sem graça. Teria um monte de justificativas para tirar do baú. Ela foi alfabetizada em inglês, usa óculos porque tem três graus de hipermetropia, ainda está no ciclo de alfabetização, etc, etc... Mas, não sei por que disse apenas que não entendia também os seus erros. 

Ela escreve "crese"  e tem problema com o futuro que faz com "ram" no lugar de "rão", mas nada que vá fazer alguém morrer de infarto. 

Agora, imaginem o meu susto ao receber a prova de português da menina. Um 7,5  não é uma notona, mas fui atropelada pela correção da professora. Estava lá a resposta da interpretação de texto:

Como o doutor ajudou Paulinho?

"Explicando que quando o menino crese (cresce) a alergia desaparece (desaparesse). 

O que está entre parênteses é a correção da professora. Acreditem!

Não é assustador? A professora "descorrigiu" a palavra escrita corretamente. Um erro crasso cometido por uma professora de um dos melhores colégios privados da capital do país. Fico imaginando como anda a educação Brasil afora. 

Conversava outro dia com a coordenadora de um cursinho pré-vestibular de Brasília e ela me dizia o inacreditável: alunos estão chegando ao ensino médio sem saber a tabuada. 

Pior tragédia é quando ouço pais de classe média refinada, que exibem roupas caras e sentam-se à mesa de restaurantes de luxo, acríticos quanto à educação dos filhos. Acreditam que eles estão em escolas de excelência. 

Ninguém se iluda. Não existe educação de qualidade no Brasil. O currículo é gigante, confuso, não se trabalha mais fixação de conteúdo, os docentes são carentes de informação e de dinheiro (têm mais de um emprego e, portanto, não têm dedicação exclusiva e tempo para preparar aulas criativas).  
 
As crianças leem pouco e quando leem não entendem. A alfabetização até os 8 anos, programa prioritário do governo Dilma Rousseff, tornou-se emergencial porque nossos índices são vergonhosos. A média nacional é de que 15,2% das crianças não aprendem a ler e a escrever na idade certa, o que provoca uma avalanche nos saberes dos anos seguintes. Nossa educação está em naufrágio há tempos. 

Deem uma olhada pelas comerciais da cidade. Proliferam cursinhos de reforço escolar, de aulas particulares e filiais do método japonês Kumon. São os salva-vidas da educação do século XXI. O que se produz de sucesso nas salas de aulas são exemplos pinçados, resultados quase de milagres e do esforço de professores heróis aos quais me curvo de satisfação e respeito. 

Fora isso, sobra a cegueira da nossas crianças nas suas escolas. E não se admirem se elas tirarem os sapatos dos pés para conseguirem juntar mais dedinhos para achar o resultado das operações básicas. Acordem pais para a dura realidade!

Era uma vez...

Crédito: Rovênia Amorim
Nem todas as histórias infantis precisam começar assim. Mas bem escritas são encantadoras. Nos fazem sonhar a cada frase lida. Lembram da primeira historinha que leram? Eu lembro: Os Três Porquinhos. Aprendi a ler juntando as sílabas dessa historinha. 


Imagem do Google
Mas me encantei por tantas outras. Ainda hoje roubo os livrinhos das minhas filhas para sonhar mais um pouco. Gostava dos personagens que sofriam, como o Patinho Feio, e não cansava de reler o romance da bailarina com o soldadinho de chumbo que tinha uma perna só. 

Nessa época, o autor não era importante. Quem era Hans Christian Andersen? Hoje sei que ele era feio, como o patinho aos olhos de quem não enxergava a alma encantadora do filho do sapateiro que recolhia riquezas na infância pobre para construir uma literatura eterna.

Hans nasceu no dia de hoje, na Dinamarca. Como reconhecimento à sua obra, 2 de abril é o Dia Internacional do Livro Infanto-Juvenil. O nome do escritor também dá nome ao principal prêmio internacional de literatura para crianças. No Brasil, apenas duas escritoras já o conquistaram: Lygia Bojunga e Ana Maria Machado.

Entre os clássicos de Hans, um dos mais famosos é o da Pequena Sereia, que se apaixona por um humano. Em Brasília, diante do Ministério da Marinha, há um pequeno espelho d'água com a obra A Sereiazinha, presente do governo da Dinamarca a Brasília no ano da sua inaguração, em 1960. 

Enquanto eu me encantava com a Sereiazinha, o marinheiro de sentinela observava-me:

- Ela não é encantadora? - provoquei-o.

- Também sou apaixonado por ela... - confessou-me, num sorriso sem graça.

Quem disse que a história de Hans Christian Andersen não pode ser real?

Atento aos sinais

Sabe, às vezes o improviso vale muito. Faz a diferença entre o perfeito e a tentativa. Nunca tinha ido a um show do Ney Matogrosso. A todos que me perguntam sobre o show no último sábado, digo que foi um show perfeito. Mas não posso demonstrar empolgação. Por quê? Faltou o improviso na noite de lua cheia.

Aos 71 anos, o artista exibe um corpo invejável. Dança e canta bem, é  perfomático no palco, tão profissional que foge do improviso. Ele apresentou as músicas novas, fez a histeria das mulheres ao rebolar com sensualidade, mas voltou para o esperado bis sem cantar suas músicas mais populares. Deixou a plateia da cidade onde morou por tantos anos com a sensação de que faltava algo.

Resultado: as pessoas insistiram um segundo bis. Ney voltou sozinho e apresentou suas desculpas:

- Até gostaria de cantar mais para vocês, mas não ensaiamos nenhuma outra música!

Os seus fãs entenderam e começaram a deixar o local do show.  Estiquei os ouvidos para apanhar os comentários. Todos pareciam entender o artista que comemora 40 anos de carreira.

- Ele é metódico, perfeccionista.

- Ele é o máximo. Se voltar a Brasília em outubro para fazer show, eu venho de novo!

Cada um buscava uma desculpa, mas, na verdade, faltou o improviso. O valoroso improviso do artista. Mesmo sem ensaio, todos ali cantariam juntos e ajudariam. Os aplausos teriam sido mais intensos.  E eu vou comprar o disco novo, aprender as músicas para poder cantar em noite de lua cheia num lugar onde ninguém me ouça!




Um dia depois...

Foto: Tumblr
Só um desabafo. Que faço com tanto chocolate em casa? Minha casa parece loja de shopping. Aliás, bem pior. Porque agora elas estão bem diet, não? Sabe que fiz? Acordei bem cedo e fui subir escadas na academia. Uma hora para vencer os degraus. Saí de consciência mais leve. Não quero ficar fofa como esse coelho aí. Cadê as orelhas?